1ª mulher a comandar unidade do Exército diz estar segura de seu potencial


Com uma carreira de mais de 20 anos na medicina, sendo 19 anos deles no Exército, a major Carla Maria Clausi, primeira mulher a comandar uma unidade militar do Exército Brasileiro, afirma ter noção dos desafios que estão por vir, mas, ao mesmo tempo, sustenta estar segura de seu potencial para gerenciar o hospital. Ela assumiu no último dia 23 a direção do Hospital de Guarnição de João Pessoa e vem se preparando para liderar cerca de 300 subordinados, entre médicos, enfermeiros e outros oficiais.
Formada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), com especialização em terapia intensiva pela Université Libre de Bruxelles, na Bélgica, e tendo quatro línguas – inglês, francês, italiano e espanhol – no currículo, ela explica que, ao contrário do que podem imaginar, não enfrentou resistências dentro da Força Armada para mostrar o potencial.
“Existe uma coisa que se chama meritocracia e dentro das Forças é isso o que conta. Não importa se você é homem, se você é mulher. Se você é bom, você é valorizado porque é bom. Se você é dedicado, se você é focado, se você dá o teu sangue por aquilo, você é reconhecido, ganha destaque, ganha medalha. Por isso, a gente tem muito orgulho de ostentar as medalhas”, revela, apontando para as insígnias expostas em seu fardamento.
Uma delas foi entregue pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva por causa do sucesso de sua equipe na missão desenvolvida pelo Exército no Haiti. A major conta que passou 1 ano no país e, na época, chegou a ter que resgatar quatro crianças soterradas em uma escola. “Ela desabou em decorrência de um furacão e minha equipe inteira de saúde entrou lá, sabendo que estávamos correndo risco de vida, para salvá-las e conseguimos”, lembrou comovida, complementando que aprendeu bastante com o povo haitiano.
“É uma emoção ter convivido com pessoas com fome – eu nunca tinha visto pessoas morrendo de fome –, com pessoas desesperadas, ter ajudado uma população inteira, que ainda vive na fase da sobrevivência. Isso não tem preço, eu faço com amor. E todos são meus filhos. Inclusive, tenho três filhos haitianos. São três rapazes que me chamam de mãe. Conheci eles lá, comecei a acompanhá-los na época e acompanho até hoje. Ajudo na escola, pago curso. Vou tentar até trazê-los para o Brasil, porque são loucos para vir para cá”, sublinhou, expondo os motivos para não ter filhos biológicos. “Não tive por opção porque sempre fui muito dedicada à carreira”.
Comentários machistas em redes sociais diverte a major
Conforme a major Carla, o impacto de ser a primeira mulher a comandar uma unidade militar de uma instituição com mais de 365 anos traz uma grande responsabilidade e merece destaque. “Sou um exemplo. Sei que tem várias mulheres que vêm atrás de mim e sou um exemplo para elas”, assumiu, evidenciando seu pioneirismo.
“E eu só sou a primeira por questão de tempo, porque sou da primeira turma de mulheres que poderiam chegar ao cargo de direção. Mas claro que é um marco, tem que ser valorizado porque estamos começando a ocupar posições que lá atrás ninguém dava valor”, completou.
A repercussão da atual condição de Carla chamou a atenção da sociedade. Nas redes sociais, até o início da tarde do último dia 30, a publicação noticiando o novo cargo ocupado pela major no Hospital de Guarnição de João Pessoa tinha atingido a marca de mais de quarenta mil curtidas, cinco mil compartilhamentos e quase dois mil comentários. Alguns deles, com teor preconceituoso e machista, divertiu a oficial. 
“A gente mesmo, lendo os comentários, começa a dar risadas. Tem vários que defendem a gente e vários que dizem 'mulher não vai dar conta', 'mulher não tem condição'. Teve até um lá que disse 'ah, ela é muito velha, acho que não vai dar tempo de ela chegar ao generalado'. Eu me divirto”, assegura, avaliando as reações. “É a população, não tem jeito. É a cultura, o Brasil, isso faz parte da gente”. 
Para a família, o mais importante, de acordo com ela, o novo cargo trouxe orgulho. Com lágrimas e sorrisos nos rostos, parentes e pessoas presentes várias fases da vida da major acompanharam toda a cerimônia de passagem do comando. “Na hora em que você tem uma tropa inteira na sua frente, desfilando para você, a sensação é de pátria, de dever cumprido, no sentido de que estou aqui porque fiz uma coisa boa, porque merecia estar aqui”, admitiu.
Vaidade presente
Batom cor de rosa, maquiagem leve e brincos. Apesar de estar em um meio rígido, a major Carla diz que não abre mão da feminilidade e de estar bela. “Eu digo que a maior arma da mulher nas Forças Armadas é estar sempre no bolso e se chama batom”, brinca, esclarecendo as regras para não fugir do padrão estabelecido pela instituição.
“O meu batom e minha maquiagem não podem chamar a atenção, porque se eu tenho que punir alguém – espero nunca ter que punir alguém, mas se isso acontecer – ou se tiver que chamar a atenção de um homem, ele não pode olhar para mim e ficar prestando atenção na cor dos meus lábios ou na cor dos meus olhos quando estiver tomando bronca”, destacou.
Alan Richelly - Se Liga Paraíba

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