Guta Oriental: entenda como região da Síria sob intenso ataque chegou a crise humanitária

Nesta semana, uma região nos arredores de Damasco, na Síria, chamou a atenção no noticiário internacional por ser palco de sangrentos bombardeios que resultaram em 250 mortes de civis em apenas 48 horas. Trata-se de Guta Oriental, um antigo destino de viagens de final de semana para os moradores da capital síria e atualmente um dos últimos redutos de rebeldes que lutam contra o regime do ditador Bashar Al-Assad.
Nesta região, de cerca de 100 quilômetros quadrados, 400 mil pessoas vivem cercados por forças pró-Damasco. O cerco a Guta Oriental teve início em 2013, dois anos depois de explodir a guerra na Síria. O balanço de 250 vítimas entre segunda e terça-feira foi o maior já registrado em 48 horas desde aquele ano, quando a região foi alvo de um ataque químico.
Apesar de ser isolada e bombardeada há anos, desde o último domingo Guta Oriental é alvo de uma nova campanha aérea lançada pelo regime de Assad e seu aliado, a Rússia. No mesmo dia em que os bombardeios foram retomados, tropas chegaram à região para reforçar o cerco e preparar uma ofensiva terrestre, que ainda não teve início. Parece que as forças sírias e russas tentam retomar o território do controle dos rebeldes a qualquer custo.
Veja a seguir os principais pontos que explicam o que está acontecendo em Guta Oriental:

'Pulmão verde' perto de Damasco


“Guta” é um nome informal usado para se referir aos subúrbios de Damasco, que ficam no entorno do rio Barada.
Antes da guerra, Guta era uma região agrícola produtora de vegetais e frutas, incluindo damasco. Já foi o maior fornecedor de arroz, açúcar, frutas e vegetais da capital.
Era também considerado um "pulmão verde", onde os habitantes da capital passavam o final de semana.

Grupos que atuam em Guta Oriental


Os residentes de Guta Oriental estiveram entre os primeiros a se rebelar contra o regime de Assad, em 2011. A região foi tomada por rebeldes um ano depois, quando a agitação se tornou um conflito armado, com a repressão às manifestações pró-democracia, e uma sangrenta guerra civil.
Em julho de 2012, opositores que partiram para a luta armada e formaram o Exército Sírio Livre (ESL) lançaram, a partir de Guta, uma batalha contra Damasco.
A partir dessa região, os rebeldes lançam projéteis contra bairros de Damasco.
Atualmente, três grupos principais lutam em Guta Oriental:

  • Jaysh al-Islam, ou Exército do Islã. É a maior facção rebelde na região, com entre 10 mil e 15 mil combatentes, que lutam para substituir o governo Assad por um novo regime baseado na lei islâmica (sharia).
  • Faylaq al-Rahman, ou Legião al-Rahman. É ligado ao ESL e rival do Jaysh al-Islam, e diz que tem o objetivo de derrubar o regime sírio, mas não pretende transformar o país em um Estado do Islã.
  • Hay'at Tahrir al-Sham, ou Organização para a Libertação do Levante. A coalizão quer implementar uma doutrina religiosa ultraconservadora e é formado por membros da antiga Frente al-Nusra. Nega que seja a filial local da Al Qaeda.

Guta Oriental (Foto: Arte/G1)Guta Oriental (Foto: Arte/G1)Guta Oriental (Foto: Arte/G1)

Ataques químicos


Em 2013, um dos piores ataques da guerra civil na Síria ocorreu contra a região. Foguetes contendo gás sarin foram lançados contra a área, segundo comprovou mais tarde a ONU e a Organização para Proibição de Armas Químicas (Opaq). O ataque deixou mais de 500 mortos.
Nas últimas semanas, o governo Assad voltou a ser acusado de lançar vários ataques químicos em Guta Oriental, o que ele nega. Em 22 de janeiro de 2018, o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), ONG com sede em Londres, relatou 21 casos de asfixia na cidade de Duma, com moradores e fontes médicas falando de um ataque com gás de cloro.
Em 13 de janeiro, um ataque semelhante aconteceu nos arredores de Duma, de acordo com o OSDH, que falou em "sete casos de asfixia". Em 5 de fevereiro, a embaixadora dos Estados Unidos nas Nações Unidas, Nikki Haley, disse que havia "evidências claras" para confirmar o uso de cloro nos ataques no leste de Ghuta.

Desnutrição e fome


Os constantes bombardeios aéreos e de fogo de artilharia, além de deixar muitas vítimas civis, destruíram edifícios residenciais, mercados, escolas e hospitais.
O cerco à região provocou um aumento nos preços e uma escassez de commodities. Consequentemente, gerou falta de alimentos, fome, desnutrição e uma séria crise humanitária. Os comboios humanitários da ONU raramente conseguem entrar na região.
Em 2017, a ONU condenou a "privação deliberada de alimentos para os civis" como uma tática de guerra, após a publicação de fotografias "chocantes" de crianças esqueléticas no leste de Guta.
E o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) denunciou a pior crise de desnutrição desde o início da guerra em 2011, com 11,9% das crianças menores de cinco anos sofrendo de desnutrição grave, contra 2,1% em janeiro.

Rebeldes tiveram tempo para se preparar


Apesar da proximidade da região com Damasco, o Exército de Assad negligenciou Guta Oriental durante os primeiros anos da guerra civil porque se concentraram em recuperar áreas consideradas cruciais para a sobrevivência do governo, como Homs, Aleppo e regiões próximas da fronteira com o Líbano.
Assim, os grupos que atuam na região tiveram anos para acumular uma grande reserva de armas e munições que vinham de rotas de abastecimento do deserto da Síria. Também tiveram tempo suficiente para construir túneis subterrâneos secretos que os protegem de ataques aéreos. Os militantes ainda conseguiram cultivar seus próprios alimentos.
Os rebeldes sírios negociam com a Rússia o fim dos bombardeios em Guta Oriental, mas as conversas ainda não resultaram em uma trégua.
G1 

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