Com ajuda do padre Robson, suspeitos de desvios das Afipes negociaram empreendimento com até 6 mil casas, diz Ministério Público

Querendo tirar do papel um empreendimento imobiliário envolvendo a construção de até 6 mil casas, em Trindade, na Região Metropolitana de Goiânia, dois empresários investigados por supostos desvios nas contas das Associações dos Filhos do Pai Eterno (Afipes) disseram ter contado com uma intervenção do padre Robson junto à prefeitura da cidade.
As negociações de Ademar Euclides Monteiro e Onivaldo Oliveira Costa Júnior foram flagradas em ligações interceptadas com autorização judicial. Os citados negam qualquer irregularidade.
Na ligação efetuada em 5 de março deste ano, às 11h07, os empresários tratam sobre a liberação de licenças para iniciar as construções. Sobre o processo supostamente parado na administração de Trindade, Onivaldo Júnior diz que aquele "menino lá, agora é só se pedir o Pai Eterno, porque eu acho que nem o padre está atendendo mais não".
Júnior segue falando sobre a situação. "Ele falou que ia me dar uma resposta, que estava dependendo de uma reunião que teria com o padre, para ele ir na prefeitura comigo, eu e ele, para pôr um pouco mais de pressão, junto". O diálogo, porém, não cita qual o valor seria gasto no empreendimento.
Segundo as transcrições dos áudios interceptados pelo MP, "[Onivaldo] Júnior comenta sobre projeto de casas englobando a construção de até seis mil casas".
O advogado Alessandro Silvério, que defende Ademar Monteiro, esclareceu, em nota, que o cliente vendeu uma rede de televisão para a Afipe e que recebeu imóveis, como pagamento, transferidos para empresas dele, e que não há nada de irregular. Como alguns tinham pendências documentais, o padre Robson se comprometeu em ajudá-lo.
A defesa de Onivaldo Júnior, por meio do advogado Danilo Vasconcelos, disse que "o empreendimento de casas sequer foi iniciado" e que "não houve assinatura de nenhum contrato".
A assessoria de imprensa do padre Robson manifestou, também em nota, que não comenta “ligação grampeada", e que padre Robson não atua na administração pública direta nem indiretamente (veja as defesas ao final).
Padre Robson de Oliveira se afastou temporariamente das funções de reitor da Basílica de Trindade e do comando das entidades para colaborar com o MP. Ele afirma que criou as associações com nomes similares a partir de 2004, conhecidas como Afipes, com o objetivo de proporcionar auxílio na vivência da fé e propagar a devoção ao Divino Pai Eterno.
São três associações sob investigação que são ligadas ao Santuário Basílica de Trindade. Todas foram fundadas por padre Robson: Associação Filhos do Pai Eterno, Associação Filhos do Pai Eterno e Perpétuo Socorro e Associação Pai Eterno e Perpétuo Socorro.
A investigação das movimentações financeiras e imobiliárias das Afipes desencadeou a Operação Vendilhões, que investiga crimes de lavagem de dinheiro, apropriação indébita, falsificação de documentos, sonegação fiscal e associação criminosa. O MP-GO acredita que a quantia doada por fiéis foi usada para adquirir um avião, casa na praia e fazendas. Os desvios chegariam a R$ 120 milhões.
Secretário colocou funcionária para atender demanda
No mesmo dia, às 16h23, Onivaldo e Ademar voltam a se falar por telefone. Novamente interceptados pelo MP, Onivaldo diz que a "situação evoluiu" e que um secretário teria colocado uma funcionária para atender a demanda apresentada. O diálogo, porém, não especifica qual secretaria foi procurada para ajudar.
"Lá evoluiu, mas não fica pronto essa semana. O secretário não atendeu, mas colocou uma funcionária para nos atender e prometeu que semana que vem está tudo resolvido".
Ademar pergunta como está a situação "hoje" do processo. Júnior diz que "ele", podendo se referir ao padre Robson, está aguardando um relatório de Goiânia, porque a área é limítrofe com Trindade.
"Então é necessário para ele emplacar as diretrizes do empreendimento, ou diretrizes da área. Ele precisa desse respaldo de Goiânia", diz Onivaldo Júnior.
O empresário Ademar Monteiro torna a perguntar se "ele" pediu para Goiânia. Júnior diz que "sim", e que foi solicitado e cobrado de novo.
No diálogo, Ademar pergunta se fazendo isso "ele" libera [o empreendimento]. Onivaldo diz que "ele afirmou estar com a parte dele pronta, chegando lá já faz imediatamente". Ademar pergunta se o "pessoal de Goiânia não deu prazo, nada".
Na conversa que durou três minutos, Ademar pergunta se "ele" sabe com quem está na prefeitura. Onivaldo responde que "é na Secretaria de Habitação", e que vai pegar o "nome de quem resolve, que às vezes a gente consegue mexer com isso". Ademar pede: "me passa então, que eu tenho uma pessoa que pode fazer isso para mim".
O que dizem os citados
Defesa do padre Robson:
"A defesa não comenta “ligação grampeada.” Padre Robson não atua na administração pública direta nem indiretamente".
Defesa de Ademar:
"O advogado de defesa de Ademar Monteiro, Alessandro Silvério, diz que "os senhores Ademar Euclides e Marcos Antônio, meus constituintes, eram proprietários de uma rede de televisão com abrangência em todo território nacional. Essa rede de televisão foi vendida para a AFIPE, razão pela qual a AFIPE transferiu valores para uma empresa da qual meus constituintes são sócios. Como forma de pagamento também houve imóveis transferidos para outras empresas de titularidade dos senhores Ademar e Marcos. Como eles aceitaram algumas áreas que tinham pendências documentais, o Padre Robson se comprometeu em ajudá-los a resolver estas pendências. Era disso que se estava tratando nos diálogos captados. E não há nada de irregular em tal colóquio".
Defesa de Onivaldo Júnior:
Em relação aos questionamentos, segue o esclarecimento.
1 – O empreendimento das casas de Trindade não foi sequer iniciado, não houve assinatura de nenhum contrato.
2 – Tal empreendimento não teria qualquer relação com as AFIPEs.
3 – Seria uma projeto entre particulares, envolvendo um grupo do Paraná.
4 – Tal empreendimento iria beneficiar muito a comunidade de Trindade, logo todos tinham interesse na agilidade, todavia, nada se concretizou.
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BORGES NETO LUCENA INOFRMA