Pouco conhecida, a diabulimia é um transtorno que acomete, em sua maioria, mulheres jovens que têm diabetes tipo 1 e boicotam o tratamento com insulina para não engordar. Assim, elas agem de forma similar às que sofrem de bulimia -- e tentam compensar a ingestão alimentar com algo que leve à perda de peso, como a indução de vômitos, o uso de laxantes, ou a prática excessiva de atividade física.
"A diabulimia, na realidade, pode ocorrer devido a uma insatisfação com o peso adquirido quando se inicia uma insulinização mais intensiva. Com isso, elas simplesmente passam a omitir ou a diminuir a dose de insulina", explica a médica.
"Outras vezes, podem também forçar vômitos ou praticar atividade física em excesso", acrescenta.
O psiquiatra Adriano Segal, diretor de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade), esclarece que a diabulimia não é um transtorno alimentar reconhecido. Ela é classificada como Tasoe (Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação).
"Trata-se de uma variação da bulimia nervosa, em pacientes com diabetes insulinodependente ou diabetes tipo 1, que deixam de usar adequadamente a insulina para evitar o eventual ganho de peso que o uso pode acarretar. O perfil geral parece bastante com o da bulimia nervosa, associada à presença da doença."
Por ser considerada uma variação, não se pode acertadamente falar em prevalência da diabulimia. Mas Segal diz que ela varia de 11% a 39% das pessoas com diabetes tipo 1. "Suas consequências são ainda mais graves do que as de sua inspiradora: lesões associadas ao diabetes 1 são graves e algumas, irreversíveis".
O primeiro caso de diabulimia foi descrito em 1973, nos Estados Unidos. Porém, hoje, com a ajuda da web, o transtorno vem aumentando, graças à troca de informações pelas redes sociais.
Segal, no entanto, vê um aspecto positivo: "O lado bom é que não só as informações deletérias estão disponíveis; as pessoas podem ser instigadas a procurar por notícias úteis".
A consultora da ADJ explica que a correlação entre transtornos alimentares e diabetes está ligada à insatisfação com a imagem corporal e ao desejo de perder peso. Também são comuns pensamentos obsessivos sobre comida e a crença de que o diabetes impede um autocontrole.
"Para piorar, pessoas com diabetes têm uma possibilidade única de manipular por vontade própria (deliberadamente) a dose de insulina para perder peso", afirma a médica, que acaba de lançar o livro "Diabulimia: uma combinação perigosa" (Editora Editora AC Farmacêutica).
Complicações
Pieper explica que, quando o paciente com diabetes apresenta o transtorno, há o aparecimento de complicações agudas e crônicas decorrentes dos constantes níveis elevados de glicemia. "Com a falta de insulina necessária, os níveis de glicose aumentam no sangue e o excesso passa a ser eliminado pela urina. Como consequência, ocorre a utilização de outras reservas de energia do organismo, como gordura e músculos".
Prevalência da omissão intencional da dose de insulina para perder peso
Meninas de 9 a 13 anos: 2%* |
Pré-adolescentes e adolescentes de 12 a 19 anos: 11%* |
Adolescentes e adultas jovens de 16 a 22 anos: 34%** |
Mulheres de 18 a 30 anos: 40%** |
*Jones JM, Daneman D. BMJ 2000;320:1563-1566 |
** Stancin T and Cols Diabetes Care 1989;12:601-603 |
De forma mais imediata, pode ocorrer a cetoacidose diabética - descompensação aguda do diabetes -, que envolve hiperglicemia e desidratação. É alto o risco de hipoglicemias graves quando as pacientes deixam de se alimentar corretamente ou quando fazem exercícios em excesso, mesmo mantendo o esquema de insulina prescrito.
As hipoglicemias graves podem causar internações de repetição, puberdade atrasada e complicações crônicas precoces.
Casos do transtorno em pessoas com diabetes tipo 2 são menos comuns, mas também existem. A endocrinologista diz que isso é mais comum em mulheres que entram na menopausa e costumam engordar. "Elas têm tendência a apresentar transtornos alimentares e fazem como as mais jovens, que manipulam a dose de insulina".
Tratamento
Segal explica que o tratamento deve se debruçar sobre a normalização dos hábitos alimentares, da atividade físicase do uso da insulina, além de levar em conta outras doenças (como depressão, por exemplo) que podem estar associadas. "Endocrinologista, psiquiatra e nutricionista são a 'equipe mínima' adequada", aconselha.
Quanto à duração do tratamento, o psiquiatra diz que não há estudos específicos, mas, provavelmente, deverá ser crônico. "Se a pessoa com diabulimia se comportar como a que tem bulimia, o transtorno será recorrente e o estado de alerta permanente é a melhor pedida. Mas, novamente, não há pesquisas suficientes sobre o tema ainda".
Sinais de alerta
Recusa em seguir as orientações médicas para aumentar a dose de insulina |
Controle metabólico instável |
Hiperglicemia (constante) |
Dislipidemia (aumento dos níveis de triglicerídeos e colesterol) |
Perda de peso |
Cetoacidoses recorrentes (descompensação aguda do diabetes por hiperglicemia) |
A pessoa evita que os pais observem a autoaplicação de insulina |
Complicações microvasculares de início precoce |
Conheça alguns mitos e verdades sobre diabetes
Diabetes
pode levar à impotência. VERDADE: com o passar dos anos, o diabetes sem
controle passa a afetar o organismo de várias formas. Por exemplo,
danifica os rins, que não conseguem dar conta de uma quantidade tão
grande de açúcar. O excesso de açúcar também afeta os vasos sanguíneos e
os nervos, o que causa falta de sensibilidade nas extremidades. "Se
afetar os vasos da região peniana, fica difícil encher o pênis de sangue
e manter a ereção, assim como pode afetar a sensibilidade", explica o
endocrinologista Felipe Gaia Leia mais Thinkstock
Conheça alguns mitos e verdades sobre diabetes
Existe
diabetes que só aparece na gravidez. VERDADE: chamado de diabetes
gestacional é a elevação dos índices de açúcar no sangue de mulheres que
tinham taxas normais antes da gravidez. Os hormônios produzidos durante
a gravidez dificultam a ação da insulina do corpo. Se a mulher já tem
tendência, está acima do peso e tem mais de 35 anos, tem mais chances de
que essa resistência seja elevada demais a ponto de se tornar um
problema como o diabetes gestacional. ?Nas demais mulheres, o pâncreas
aumenta um pouco a produção de insulina, porém, a pessoa não fica
diabética?, diz o médico Felipe Gaia Leia mais Thinkstock
Há
diabetes que são mais difíceis de se controlar. PARCIALMENTE VERDADE:
"O diabetes é uma doença progressiva. Então, em alguém que tem o
diagnóstico tardio, ou que não tratou adequadamente a doença desde o
início, o controle vai ser mais complicado", explica a endocrinologista
Denise Franco. A médica diz, no entanto, que mesmo para os casos mais
complicados, a tecnologia tem ajudado bastante no tratamento: há vários
tipos de monitores e sensores de glicose, bombas de insulina etc Leia mais Elmer Martinez/AFP
Diabético
não pode comer nada com açúcar. MITO: quando se está com a taxa de
glicemia, o açúcar no sangue, muito acima do padrão, a recomendação
médica é evitar ao máximo o açúcar. Mas, à medida em que o paciente
consegue controlar a doença, ele pode, sim, consumir doces
moderadamente. "Não existe proibição absoluta. Depois que a pessoa está
com um controle bem feito, nada impede que coma um doce eventualmente. O
ideal é que seja sempre de sobremesa, porque depois das refeições o
açúcar não é liberado no corpo tão rapidamente", recomenda o
endocrinologista Felipe Gaia Leia mais Leonardo Soares/UOL
Não
há restrições alimentares para os diabéticos além de evitar o açúcar.
MITO: além do açúcar, diabéticos precisam tomar cuidado com o consumo de
carboidratos, encontrados em produtos como batatas, massas, pães,
tortas e, em especial, os feitos com farinha branca. "Uso uma metáfora: o
acúçar é um tijolo; o carboidrato é como uma parede feita de tijolos. O
corpo desfaz essa parede para usar os tijolos", explica o
endocrinologista Felipe Gaia. Assim como o açúcar, os carboidratos não
estão completamente vetados da dieta, mas devem ser ingeridos com
moderação Leia mais André Lobo/UOL
Diabetes,
na fase inicial, não provoca sintomas. VERDADE: na fase inicial da
doença, o único indicativo é mesmo o exame de sangue. "Diferentemente de
outras doenças, o diabetes não provoca dor. Até chegar às complicações
severas, o paciente pode levar 10, 15 anos", afirma o endocrinologista
Felipe Gaia. Por isso, é importante que os pacientes sejam bem
orientados pelos médicos, para que não fiquem relapsos com o tratamento Leia mais Getty Images / Thinkstock
Comer
doce demais pode causar diabetes tipo 2. MITO: o que faz com que a
pessoa se torne diabética é o sedentarismo associado à obesidade e a uma
inflamação discreta do tecido gorduroso. O componente genético também
influencia. Não raro, uma pessoa obesa consome doces em excesso, mas não
são eles que causam o diabetes. "Se uma pessoa come muito doce, mas faz
exercícios, mantém sua cintura fina, é difícil que vá ter problemas com
diabetes", afirma o endocrinologista Felipe Gaia
Transplante
de pâncreas pode curar o diabetes. PARCIALMENTE VERDADE: o transplante
de pâncreas é uma cirurgia complicada, com riscos. Depois, o paciente
vai precisar trocar a insulina por imunossupressores, para serem tomados
durante toda a vida. E o órgão doado não costuma durar mais do que 10
ou 15 anos. Há ainda a dificuldade de se encontrar doadores. "Por tudo
isso, o transplante só é indicado em último caso, para pacientes que
estão fazendo o melhor tratamento possível, mas ainda assim têm muita
flutuação da glicemia. Em geral, o transplante se faz para quem já está
com os rins afetados; então, se faz o duplo transplante", afirma a
endocrinologista Denise Franco Leia mais Shutterstock
Todo
diabético precisa tomar insulina. MITO: para quem tem diabetes do tipo 1
não há mesmo escapatória, já que o pâncreas não é capaz de produzir
insulina. Mas para os pacientes diabéticos do tipo 2, que são 90% dos
casos, a insulina pode ser dispensada se a doença for detectada e
tratada no início. "Um diabético pode passar a vida inteira sem nunca
precisar de insulina. Mas se o pâncreas for sobrecarregado e começar a
"falhar", a melhor solução é a insulina. Nesses casos, quanto antes,
melhor", explica do endocrinologista Felipe Gaia Leia mais Thinkstock
Diabetes
é uma doença crônica que não mata. MITO: embora atualmente os
tratamentos médicos evitem as mortes por coma diabético, a doença afeta
diversas funções do organismo que colocam a vida em risco. Ou seja, ela
mata, mas de forma indireta. "Um diabético tem seis vezes mais chances
de ter infartos e derrames, assim como tem mais câncer. Outra causa
secundária de morte são as complicações renais", diz o endocrinologista
Felipe Gaia Leia mais Thinkstock
E: durante os exercícios, o corpo
usa a glicose como fonte de energia, ou seja, a atividade física tem um
papel semelhante ao da insulina. Outra vantagem é que exercícios
regulares levam à perda de peso, o que ajuda a melhorar o controle do
diabetes. "A atividade física ainda contrabalança o estresse, um fator
que agrava o quadro de diabetes", diz a endocrinologista Denise Franco Leia mais Adriano Vizoni/ Folha Imagem
O
estresse piora o diabetes. VERDADE: fatores de estresse podem, sim,
piorar o quadro de diabetes quando já existe o problema, mas isso não
significa que o estresse cause o diabetes. "O nível de açúcar sobe
quando as pessoas ficam nervosas, assim como a adrenalina e o cortisol.
Quando o pâncreas está comprometido, ele não aguenta essa elevação",
explica a endocrinologista Denise Franco. Segundo ela, o estresse tem o
potencial de desbalancear os sistemas endócrino, imunológico e
neurológico Leia mais Thinkstock
Diabéticos
podem comer produtos diet à vontade. MITO: "Ninguém pode comer nada à
vontade", alerta a endocrinologista Denise Franco, diretora da
Associação Diabetes Brasil. "Muitas vezes a gente nem recomenda o
produto diet, como um chocolate, porque ele tem mais gordura, o que
também faz mal", diz. Já um doce de frutas com adoçante costuma ser uma
boa opção de sobremesa diet Leia mais Thinkstock
Diabetes
tipo 2 só aparece em adultos. MITO: até pouco tempo atrás, o
aparecimento do diabetes tipo 2 (que está ligado ao sedentarismo e
hábitos alimentares poucos saudáveis) era registrado em adultos,
sobretudo a partir dos 40 anos. Mas hoje está cada dia mais comum também
em adolescentes e crianças. "Até 15 anos atrás, a gente definia que o
diabetes da criança era a tipo 1. Agora, isso não é mais verdade",
afirma a endocrinologista Denise Franco Leia mais Thinkstock
Cirurgias
de redução de estômago/intestino curam o diabetes. MITO: embora a
maioria das pessoas que passa por essas cirurgias registre melhora nos
níveis de glicemia, se voltar a engordar, a doença retorna. "Por
enquanto, o diabetes não tem cura. A pessoa vai ter de se preocupar
sempre em manter a doença controlada", informa a endocrinologista Denise
Franco. As cirurgias bariátricas também não ajudam pessoas cujo
pâncreas já foi danificado e não produz mais insulina Leia mais Thinkstock
Diabetes
é genética. PARCIALMENTE VERDADE: no diabetes do tipo 1 há um forte
componente genético, explica o endocrinologista Felipe Gaia. Filhos de
uma mãe ou pai diabéticos têm 10% de chances de também desenvolverem a
doença. Quando se trata do tipo 2, há uma série de causas, entre elas o
fator genético, que deixa a pessoa mais propensa a ficar diabética. "Mas
quem se cuida, se alimenta bem e faz exercícios, tem uma relativa
proteção", garante o médico Leia mais Thinkstock
Chá
de pata de vaca é bom para quem tem diabetes. PARCIALMENTE VERDADE:
embora tenha o potencial de diminuir a glicemia, o chá da planta
conhecida como pata da vaca é contraindicado como forma de tratar o
diabetes. "Ele aumenta a secreção de insulina, mas é muito difícil fazer
o ajuste para a dose certa quando se trata de um chá. Quanto do
princípio ativo tem em cada xícara? Você também não tem como saber se o
solo, por exemplo, influenciou na ação da planta", explica a
endocrinologista Denise Franco Leia mais Eduardo Knapp/Folhapress
Existe
uma categoria de "pré-diabéticos". VERDADE: essa denominação é recente,
mas vem sendo usada por muitos médicos de 2010 para cá, diz o
endocrinologista Felipe Gaia. Ela é utilizada para designar alguém cujos
índices de glicemina e outros indicadores de diabetes ainda não
atingiram o patamar para que o paciente seja considerado oficialmente um
diabético, mas que estão muito próximos do limite. "É como um sinal
amarelo, e piscando com força", diz Gaia Leia mais Thinkstock
O
diabetes do tipo 1 é pior que o do tipo 2. PARCIALMENTE VERDADE: o
pâncreas do portador do diabetes tipo 1 não produz nenhuma insulina, o
que torna o tratamento mais "trabalhoso", segundo o endocrinologista
Felipe Gaia, consultor do SalomãoZoppi diagnósticos e da Sociedade
Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. "Desde o início temos que
fornecer insulina de forma a simular o trabalho do pâncreas", afirma. Já
no diabetes tipo 2, o pâncreas produz insulina, mas ela não consegue
atuar corretamente no corpo. "No começo do tratamento, e se a pessoa se
cuidar sempre, basta emagrecer e fazer atividade física", diz. Mas, se o
paciente não se cuidar, pode ficar com o pâncreas com a capacidade de
produzir insulina totalmente comprometida, como o de um paciente do tipo
1 Leia mais Thinkstock
Diabetes
pode causar cegueira. VERDADE: embora o diabetes possa seguir muitos
anos assintomático, uma das possíveis complicações de se ter a doença
sem controle por um longo período é a cegueira. "O diabetes estimula o
crescimento de vasos na retina, o que acaba levando a sangramentos. E
também pode provocar o descolamento de retina", afirma o
endocrinologista Felipe Gaia Leia mais Thinkstock
BORGES NETO LUCENA INFORMA
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