Pesquisadora da UFPB participa de estudo que revela fauna microscópica em cascos de tartaruga

Os cascos das tartarugas-marinhas-comuns, também conhecidas como tartarugas-cabeçudas, contêm grande quantidade de fauna composta por seres microscópicos. O fato foi evidenciado em artigo publicado por uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade do Estado da Flórida (FSU), nos Estados Unidos.
A pesquisadora Yirina Vazquez, do Departamento de Ciências Biológicas, no Centro de Ciências Agrárias da UFPB, no campus II, em Areia, afirma que o estudo demonstra a importância da conservação das tartarugas e proteção dessas comunidades que não possuem capacidade ou facilidade de se mover, ou seja, de dispersão ativa nos oceanos.
O trabalho foi realizado com tartarugas-cabeçudas que emigram para a Ilha St George, ao norte da Flórida, para desovar. A pesquisa de campo ocorreu em 2018. Esta é a terceira publicação consecutiva do grupo de pesquisadores coordenado pelo professor Giovanni dos Santos (UFPE), cujos estudos sobre o assunto já duram cerca de dez anos.
As duas publicações anteriores sobre o assunto foram sobre tartarugas-de-pente que desovam no litoral pernambucano, paraibano e de outros estados do Nordeste. De acordo com Yirina Vazquez, que também atua como professora na UFPB, o casco da tartaruga tem fauna mais abundante que qualquer outro substrato consolidado, vivo, morto, móvel ou fixo.
O estudo também possibilita responder a um paradoxo antigo conhecido como The Meiofauna Paradox, o paradoxo da meiofauna, que se refere a como os pequenos organismos bentônicos da meiofauna são distribuídos em grandes extensões geográficas, já que não têm capacidade ativa de dispersão.
“Meiofauna é um conjunto de animais que vivem enterrados no solo ou no sedimento de ecossistemas aquáticos. Os organismos meiofaunais são uma vasta fonte de biodiversidade e cumprem importantes papéis ecológicos em todos os ecossistemas marinhos”, ressalta a professora Yirina Vazquez.
Conforme Giovanni dos Santos, que é biólogo marinho, o estudo comprova que a tartaruga facilita a dispersão dos microrganismos para estabelecer a diversidade dos solos ou substratos do oceano, ao redor da sua rota migratória. “Isso quer dizer que esses microrganismos pegam “carona” nos cascos das tartarugas”, conta o professor.
“Esses microrganismos que a gente chama de metazoários não têm fase larval. Então sempre existiu essa dúvida de como eles se dispersavam. Existiam teorias de que eles entravam na corrente marítima. Só que eles não têm capacidade de nadar. Então, na corrente marítima, seria muito ao acaso. Quando a gente publicou isso pela primeira vez, começou a levantar uma possibilidade de que a tartaruga, além da importância da conservação da sua espécie, era um dispersor de diversidade ao redor do mundo, já que a sua rota migratória é muito grande”, explica Giovanni dos Santos.
De acordo com a pesquisa, as tartarugas marinhas migram milhares de quilômetros por ano entre as áreas de reprodução e de forrageamento, para busca e a exploração de recursos alimentares, carregando dezenas de espécies de epibiontes com elas em suas viagens. Epibiontes são organismos de tipo séssil ou não, que vivem sobre outro ser vivo, sem que haja parasitismo ou simbiose.
A maioria dos estudos sobre epibiontes de tartarugas marinhas se concentrou em organismos de grande porte, aqueles visíveis a olho nu. Os pesquisadores da UFPB, UFPE e FSU, no entanto, relatam níveis anteriormente não documentados de abundância e biodiversidade de epibiontes para tartarugas-cabeçudas, concentrando-se na meiofauna microscópica.
O artigo mostra que as tartarugas-cabeçudas são altamente migratórias, capazes de percorrer centenas a milhares de quilômetros entre áreas de criação e forrageamento, onde a colonização pode ocorrer.
Dentre os resultados que mais chamaram atenção no artigo, segundo o professor Giovanni dos Santos, está o fato de que as carapaças da cabeçuda são, sem dúvida, hotspots de diversidade, ou seja, áreas com grande biodiversidade, em comparação com outros substratos não sedimentares.
“É como se a tartaruga viajasse com uma cidade inteira de microrganismos nas costas. A diversidade que tínhamos encontrado na tartaruga-de-pente já era muito alta. Só que a que a gente encontrou nessa tartaruga-cabeçuda, do Golfo do México, é maior ainda. Essas duas tartarugas são extremamente diversas em fauna no seu casco e prestam um serviço ecossistêmico de manutenção da diversidade em áreas que elas visitam, por elas viajarem com essa diversidade no casco delas”, esclarece o pesquisador.
Segundo ele, foi encontrado cerca de 30% a mais de espécies na tartaruga-cabeçuda, em relação à tartaruga-de-pente. O pesquisador destaca que a meiofauna é a base da cadeia trófica, isto é, da cadeia alimentar.
“Essa fauna microscópica é a base da estabilidade dos substratos marinhos, é o estabilizador de todos os processos e de toda a fauna existente no oceano. A tartaruga presta um serviço muito importante”, afirma Giovanni.
Segundo a professora Yirina Vazquez, com a fauna que a tartaruga tem no casco, os cientistas têm condições de saber os locais que esse animal visitou, servindo como um localizador natural.
A pesquisa é um consórcio entre universidades brasileiras e a Universidade do Estado da Flórida (FSU). Os professores Yirina Vazquez e Giovanni dos Santos coordenam a pesquisa no Brasil e os docentes da FSU Jeroen Ingels e Mariana Fuentes, que é brasileira, coordenam os trabalhos nos Estados Unidos.
O artigo é citado em várias revistas on-line internacionais e já rendeu convites para a elaboração de podcasts e entrevistas com a revista Hakai e o Sciencelab.co.uk.

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BORGES NETO LUCENA INFORMA